* Luiz Henrique Ceotto

De certa forma a produtividade não tem sido um conceito muito valorizado pela nossa Construção Civil, principalmente pelo setor de edificações. Em minha opinião esse comportamento decorre da histórica baixa qualificação da nossa mão de obra nas últimas décadas. Como baixa qualificação é intimamente ligada à baixa remuneração, o desperdício de mão de obra nunca foi uma preocupação que pudesse tirar o sono de um engenheiro, apesar de todos falarem o contrário.

Nos últimos 30 anos nossa economia cresceu pouco e teve diversas e sucessivas crises. Investimentos significativos em tecnologia que pudessem resultar num aumento significativo de produtividade foram experimentados por pouquíssimas empresas e na maioria das vezes abandonados. Com os altíssimos juros praticados nesse período, o aumento da produtividade não foi suficiente para remunerar esses investimentos. Como conseqüência o setor ficou atavicamente ligado ao uso da mão de obra intensiva e acabou se acostumando com isso.

Entretanto os tempos mudaram e pouca gente percebeu a profundidade dessas mudanças. Estamos diante de uma mão de obra melhor remunerada, embora ainda distante do ideal, e os custos indiretos fazem com que o custo do trabalho seja muito alto comparado a remuneração, a regulamentação e normalização do trabalho estão muito mais exigentes e complexas, existe hoje financiamento para a construção e com isso as obras precisam ser construídas mais rapidamente, as exigências de nossos clientes aumentaram muito com a Lei de Defesa do Consumidor, a burocracia governamental e os prazos para aprovação de projetos e “Habite-se” triplicaram, a competição entre as empresas se acirrou e com isso as margens de lucro reduziram-se drasticamente.

Dessa forma, o que resta para as construtoras enfrentarem esses desafios? Em minha opinião, resta justamente o investimento na produtividade. Se não encararmos essa questão de forma definitiva corre-se o risco da construção civil permanecer sendo uma indústria instável, pouco rentável e destinada a atrair poucos investimentos.

Nesse presente artigo vamos discutir como medir a produtividade de forma simples e com baixo custo bem como usar a medida de produtividade de uma obra para analisar seu estágio tecnológico. No próximo artigo vamos discutir como melhorar a produtividade na obra atuando nas diversas etapas que compõem o processo de construção.

Conceito de produtividade

O conceito da produtividade é muito simples e nada mais é do que a quantidade de um insumo necessária para a fabricação de uma unidade de produto. Para fins desse artigo estaremos falando na produtividade do trabalho humano, ou seja, a quantidade de horas homem trabalhadas para produzir uma unidade de produto. Essa unidade pode ser 1 m2 de construção, 1 m2 de alvenaria, 1 m3 de estrutura e assim por diante.

Medição da produtividade

A produtividade é mais lembrada quando, ao se fazer um orçamento, nos deparamos com composições tiradas de revistas, que não levam em conta o processo de trabalho utilizado, as especificidades dos serviços a serem executados, ferramentas e equipamentos utilizados e inexplicavelmente sempre induzem uma proporção 1:1 entre oficiais e serventes. Ao se tentar medir e controlar a produtividade usando-se essas composições é necessário a utilização de inúmeros “apropriadores”, pois o serviço é planejado de forma muito fragmentada tendo como resultado enorme variabilidade nos números. A dificuldade da medição e os altos custos dessas apropriações desestimulam essas iniciativas e pouca coisa tem sido feita na melhoria essa abordagem.

Para obtermos números mais estáveis e, portanto mais úteis num processo gerencial, a produtividade tem que ser avaliada em conjuntos de trabalhos mais abrangentes. Dessa forma, é mais importante saber primeiramente o total de mão de obra usada para se fazer toda a estrutura do que a produtividade para o corte de chapas de compensado. Os valores da produtividade da estrutura são muito mais estáveis do que a produtividade do corte das chapas, a qual dependerá de diversos fatores e será muito mais influenciada por qualquer pequena variação desses fatores.

Isso decorre da “Lei dos Grandes Números” onde uma variável estatística decorrente de uma grande soma de fatores aleatórios tende a variar menos do que outra decorrente de uma seqüência menor. Não quero dizer que a medição da produtividade de etapas de um serviço nunca deva ser feita, mas que é mais importante controlar a produtividade do serviço completo de forma contínua do que tentar obter a produtividade de cada uma das partes do processo. A produtividade das partes deve ser obtida eventualmente por estatística de forma a avaliar o entrosamento do fluxo de produção.

A produtividade total do serviço pode ser facilmente avaliada, com custos muito baixos, dispensando-se a utilização de “apropriadores” bastando-se para isso se usar recursos já implantados pela maioria das empresas do setor tais como o crachá de identificação e/ou o diário de obra.

Cada operário ao entrar num canteiro de obras deve estar devidamente identificado e com o treinamento admissional de segurança feito. O instrumento de identificação é o crachá e ele pode ser “lido” na entrada da obra através de sistema de catracas ou por sensores de aproximação (menos sujeitos a defeitos por intempéries).  Caso a obra não disponha desse tipo de sistema, cada empreiteiro ou líder de equipe deve informar diariamente à administração da obra a relação do pessoal que está sob sua responsabilidade. Essa relação com o nome de cada trabalhador e a equipe a que pertencem deve ser apontada no diário de obra. Com essas informações é possível se obter a produtividade alcançada no final de cada serviço, de forma muito simples.

Como cada operário trabalha, ou está disponível para trabalhar, diariamente por nove horas, o total das horas trabalhadas (ou disponíveis) no final de qualquer serviço pode ser obtido pela soma do produto do efetivo diário por 9 hs (considerar o trabalho aos sábados com 5 hs). Como cada trabalhador pertence a um empreiteiro ou a uma equipe de um serviço específico, podem-se obter as horas trabalhadas em cada serviço (estrutura, alvenaria, massa de fachada, sistemas hidro-sanitários, etc) pela alocação correta do operário em cada serviço no diário de obra.

A produtividade pode ser obtida dividindo-se essas horas trabalhadas pela quantidade de serviço executado (m2 ou m3 de estrutura, m2 de parede pronta, pontos hidráulicos, pontos elétricos, etc). Nesse procedimento não é possível se saber a produtividade da fixação das prumadas hidráulicas em um edifício, mas é possível com facilidade saber a produtividade da execução do sistema hidráulico por banheiro ou por m2 de área construída.

A produtividade medida dessa forma considerará horas ociosas, horas perdidas por falta de materiais, horas de transporte de materiais, etc, mas do ponto de vista do controle da produtividade é isso que realmente importa. Pouco adianta saber a produtividade de um serviço com dedicação total e com tudo dando certo e ninguém fazendo mais nada. Essa produtividade “ideal” é somente importante para se saber o “potencial” de produtividade que se pode almejar. Essa produtividade “potencial” deve então ser obtida por amostragem e somente de forma eventual.

A produtividade total da obra é então obtida da mesma forma, pela soma do efetivo diário multiplicado pela jornada de trabalho diária. Muitos poderão argumentar que existem algumas imprecisões nessa avaliação. Mas é certo que a magnitude delas é muito pequena e é preferível obter uma medição de produtividade confiável com baixo custo de apropriação do que se tentar uma muito precisa e complicada com alto custo de obtenção.

Luiz Henrique Ceotto

Professor voluntário do curso de pós-graduação na Escola Politécnica da USP e consultor no programa de financiamento de projetos da Poli-EMBRAPII. Responsável pelas atividades de projeto e construção, no Brasil, na Tishman Speyer por 12 anos. Antes de ingressar na Tishman Speyer em 2005, passou mais de 20 anos liderando as atividades de construção da Encol S/A e da Inpar. Ensinou em cursos no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de São Carlos. Engenheiro civil pela Universidade de Brasília e mestre em Engenharia estrutural da Escola de Engenharia de São Carlos (USP).

Artigo publicado em 04/04/2018 no blogdaliga.com.br

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