O setor de construção civil ainda é geralmente lembrado como um setor econômico de baixa produtividade, quando comparado a outros setores da economia no Brasil e em outros países. No caso brasileiro, estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2015), aponta que a construção civil apresenta um “duplo gap”, pois sua produtividade é inferior à produtividade média da economia e é menor que a produtividade do mesmo setor em países mais avançados.
São muitos os fatores que contribuem para a baixa produtividade setorial, e os primeiros a serem lembrados geralmente são relacionados aos processos e tecnologias empregadas em todo o ciclo das obras, desde a concepção até a entrega. Limitar esse debate exclusivamente a essas questões é superficial, pois muito relevantes são outros fatores que também explicam essa defasagem apurada. Questões relacionadas ao ambiente regulatório, burocracia, modelos de financiamento e modelos de tributação, que interferem no processo de decisão pelas tecnologias a serem empregadas, acrescentam custos ou impõem restrições de prazos e acesso a recursos financeiros.
O acesso a informações e às mais avançadas tecnologias que podem promover ganhos de produtividade para o setor da construção está cada vez mais rápido e facilitado: BIM, sistemas e elementos industrializados, construção modular, e aplicação de diferentes tecnologias da indústria 4.0 em diversos processos da construção já estão presentes no mercado brasileiro e tornando-se cada vez mais comuns. Alguns sistemas industrializados há décadas já se fazem presentes no país, então, por que ainda não há uso disseminado em larga escala desses outros sistemas? A resposta está na existência de barreiras relacionadas aos fatores mencionados no parágrafo anterior.
As principais barreiras dessa natureza para o caso da industrialização da construção já foram identificadas, mapeadas e resumidas num folder recentemente publicado. Entre elas se destacam a falta de isonomia tributária entre processos construtivos convencionais (no canteiro) e industrializados (“off-site”) que desestimula a adoção destes, a inadequação dos modelos de financiamento e liberação de recursos que não consideram a execução paralela e complementar de partes da obra dentro e fora do canteiro, além de modelos de contratação de obras públicas que não preveem produção de partes das obras de forma diferente da convencional.
O caminho para vencer essas e outras barreiras para a disseminação de novas tecnologias que contribuam para o aumento de produtividade no setor passa necessariamente pela atuação conjunta, com base em diagnósticos precisos lastreados em dados e formulação de propostas concretas, dos agentes da cadeia produtiva da construção, representados por suas entidades, com o Governo. Na prática, o desenvolvimento do ecossistema de inovação na construção civil exigirá adequações de leis e regulamentos, simplificação e desburocratização de processos, e aprimoramento de políticas públicas voltadas ao setor.
O tema da produtividade no setor vem sendo alvo de diversas ações das entidades. Iniciativas como a Plataforma e o Prêmio Produtividade do Mesmo Lado, eventos, publicações técnicas, ações de capacitação, elaboração de diagnósticos e propostas para solucionar barreiras são exemplos da produção colaborativa das entidades do setor.
Com o Governo, a colaboração também acontece há anos (inclusive definindo recentemente o setor como essencial para o país durante a pandemia do COVID-19) e já conseguiu que o tema da produtividade entrasse definitivamente na agenda de políticas públicas para o setor, como um significativo pilar potencial de geração de empregos e atração de investimentos.
Frutos desse incessante esforço geraram importantes ações recentes do Governo Federal, entre as quais destacamos:
– o lançamento da Estratégia Nacional de Disseminação do BIM pelo Governo Federal em 2018, com horizonte de ações em 10 anos para estimular o uso da tecnologia, que envolveu 9 ministérios e promoveu amplo debate e alinhamento prévio com o setor;
– a iniciativa de grande destaque, a partir da qual temos expectativa de fortes avanços em breve, foi a publicação, no final de 2019, de um Edital do Ministério da Economia que propôs 9 metas voltadas à elevação da produtividade da construção civil no país. Essas metas são voltadas aos temas de convergência dos Códigos de Obras e Edificações, criação do Portal da Construção Civil, difusão do Building Information Modeling (BIM) no Brasil, elaboração de regulamentos técnicos referentes à coordenação modular e incentivo à construção industrializada. As ações se iniciaram em meados de 2020 com participação de mais de 10 entidades representantes dos agentes da cadeia produtiva da construção e especialistas, e devem se encerrar até o próximo ano. Deste trabalho resultarão novas propostas, regulamentos, manuais de boas práticas, conteúdos de capacitação, que contribuirão para elevação da produtividade da construção no país.
Laura Marcellini é Diretora Técnica da ABRAMAT, Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção