* Marcos Hesketh
A produtividade na construção civil requer uma visão analítica profunda. Caso contrário, teremos mais do mesmo, talvez mais caro e com mais desgaste
Há muitos anos, as empresas e profissionais que atuam no setor vêm travando uma batalha pelo aumento da produtividade na construção civil em seus canteiros de obra. São elaborados programas específicos, tomadas iniciativas próprias, envolvidas consultorias, adquiridas ferramentas especializadas, e tantas outras ações. Dessa forma, não seria justo afirmar (e quase ninguém deve discordar) que os players desse mercado – cada qual à sua maneira – não dão importância a esse item. Até porque há muita coisa envolvida, inclusive dinheiro.
Mas será que estão todos satisfeitos com as iniciativas de mais produtividade na construção civil, que foram adotadas em suas obras? Me arrisco a dizer que não. Ou, que não totalmente.
A questão que sempre me incomodou, é o fato de que todo o esforço empreendido (leia-se também energia e recursos diversos) acaba apresentando, em determinado momento de controle, resultados fracos e não duradouros. O bom resultado fica aquém do esperado. O bom resultado não se perpetua. O bom resultado não é incorporado.
Sem dúvida são inúmeras as variáveis que levam a isso, como a tecnologia, a cultura organizacional, as tipologias das obras, os prazos, os recursos, etc.
Nesse pequeno texto, meu foco é sobre os ralos. Os ralos por onde vazam a produtividade na construção civil. E confesso, como profissional da área, que isso me incomoda demais.
Sim, vão dizer que a indústria seriada (do tipo das linhas de produção) lida e evolui constantemente os seus indicadores. Mas por uma razão simples: na atividade industrial, é considerado o Processo, e não somente a Atividade. E, claro, guardadas todas (e muitas) as diferenças entre essas “indústrias”, pelo menos uma coisa elas têm em comum: as tarefas são concatenadas e muitas vezes sequenciais.
Portanto, deve-se adquirir uma visão analítica sobre os processos e entender a variabilidade (alta) inerente a eles.
Veja o exemplo abaixo. Trata-se de um fluxograma muito simplificado, que representa a elevação de uma parede de alvenaria em um prédio:
Normalmente, todas as iniciativas são direcionadas à “atividade nobre”, ou seja, aquela considerada a mais importante, de mais visibilidade, que se dá na frente de trabalho. Os colaboradores são treinados, os melhores materiais, equipamentos e ferramentas são disponibilizados, e são definidos os indicadores de produtividade dessa atividade.
Para a felicidade geral da nação da obra, os indicadores ali são ótimos! Mas, na linha de base do cronograma, essa etapa atrasa. E, estando associada a outras (inclusive a algumas do Caminho Crítico), a obra também atrasa.
E agora? O que aconteceu?
A resposta está no fato de que as atenções e iniciativas foram direcionadas somente à atividade produtiva, como se fosse a única. Não houve preocupação de se olhar o processo todo, ou seja, ter um foco analítico nas atividades que poderiam ser eliminadas, e também naquelas que poderiam ser racionalizadas.
No nosso exemplo, foram negligenciadas as etapas de movimentação, estoques, e de preparação do trabalho. Basta que um material não esteja na frente de trabalho no momento certo, para que a tal “atividade nobre” – a execução da parede – sofresse com uma espera e, portanto, tempo sendo gasto para produção nenhuma.
Resultado: uma parte do potencial de ganho de produtividade “vazou”, foi para o “ralo”, consumido ao longo do processo, por atividades sem a atenção devida.
Nesse campo, são muito bem-vindas as abordagens oferecidas pelo “Lean Construction” (a Construção Enxuta), os conceitos de gerenciamento de projetos preconizados pelo PMI®, e também as ferramentas de Mediação e Negociação a serem aplicadas a todos os players do negócio.
Como se vê, lidar com a produtividade em um produto permeado por tanta variabilidade, variáveis e agentes, requer uma visão analítica profunda. Também é inquestionável que as empresas “ajustem” a sua cultura para que iniciativas positivas (as tais “boas práticas”) sejam entendidas, incorporadas e perpetuadas até a próxima evolução. Sim, tem também que haver evolução e transformação constantes.
Portanto, julgo adequado afirmar que nesse momento em que a Construção vem sendo “assediada” por tantas inovações da chamada “Indústria 4.0”, há que se ter cautela e discernimento para se fazer um bom uso disso tudo, em benefício também da produtividade, desde que a visão do gestor também seja “calibrada”. Caso contrário, teremos mais do mesmo, talvez mais caro e com mais desgaste. E isso não é evolução.
Marcos Hesketh
Sócio-Diretor da Hesketh Engenharia.
Artigo publicado em 01/10/2018 no blogdaliga.com.br