* Bruno Bachiega
É preciso entender que a produtividade de uma obra ou de atividades de uma obra não depende apenas da mão-de-obra em si, mas sim de um conjunto de fatores internos e externos dos mais variados e abrangentes
Índices de produtividade na construção que sejam confiáveis são ativos preciosos em projetos do setor não apenas para estimar prazo e custo, mas também para auxiliar no cálculo da tendência de conclusão desses projetos durante sua execução.
Se você é um profissional de planejamento ou orçamento de obras com certeza terá aquelas planilhas cheias de índices históricos de produtividade, na maioria das vezes sem “pai nem mãe”, resultados do networking com vários outros profissionais, inclusive de outras empresas, que compartilharam seu conhecimento e lições aprendidas ou que simplesmente repassaram aquilo que receberam. No final, com o passar do tempo e sem rastreabilidade e padrões definidos, toda essa informação acaba caindo no nicho das estórias populares: passamos de geração para geração sem sabermos ao certo de onde vieram, como surgiram e se possuem algum fundo de verdade.
Imagine você aplicando, sem saber, índices de produtividade provenientes de uma obra pública de construção para estimar o prazo de atividades similares em uma obra privada do setor industrial de óleo e gás. O estrago pode ser grande.
E mesmo empresas que tentam manter um banco de dados histórico com os índices de produtividade de suas obras podem estar gerando dados inconsistentes ou sem informações suficientes caso não haja um processo padronizado para levantar e classificar esses índices, bem como pessoas treinadas para conduzir esse processo.
Além disso, é preciso entender que a produtividade de uma obra ou de atividades de uma obra não depende apenas da mão-de-obra em si, mas sim de um conjunto de fatores internos e externos dos mais variados e abrangentes.
Por esse motivo é de extrema importância que cada índice esteja atrelado a um conjunto de informações categorizadas que descrevem as características da atividade a que se refere o índice e a composição do mesmo, como exemplificado na figura abaixo.
As características da atividade a que se refere um determinado índice de produtividade são na verdade fatores que influenciam diretamente na produtividade de atividades de construção. Já a composição do índice define em que base de tempo e recursos o valor do índice será gerado. Em conjunto, todas as informações acima definem onde e como o respectivo índice poderá aplicado.
Informações sobre o ambiente de mercado em que se enquadram os projetos ou empreendimentos de onde foram levantados os índices, bem como sobre os owners desses projetos, são de extrema importância, pois cada ambiente e patrocinador possuem seus próprios níveis de exigência de qualidade, saúde, segurança, meio-ambiente entre outros, regidos por legislação, padrões nacionais e internacionais ou políticas internas, e que impactam diretamente na produtividade das obras. Altos níveis de exigência tendem a reduzir a produtividades, e vice-versa.
A localização geográfica é outro fator importante que afeta a produtividade, uma vez que o clima e a qualidade da mão-de-obra possuem características regionais, assim como as condições físicas do ambiente em que o escopo contratual é executado: obras em ambientes do tipo greenfield tendem a ser mais produtivas que em ambientes brownfield e greyfield respectivamente.
No âmbito da engenharia, obras que iniciam com desenhos e documentação técnica incompletas ou com baixo nível de maturidade tendem a ter mais problemas de especificação de engenharia que podem causar retrabalhos durante a construção, paralisações e quebras nas sequencias de trabalho.
Já no âmbito contratual, a modalidade de contrato adotado com a construtora define indiretamente com quem fica o impacto no caso de ocorrência do risco de baixa performance de custo e de prazo, e consequentemente define se o foco da empreiteira contratada será ou não a performance em produtividade. Obras com preço fixo ou global tendem a ser mais produtivas.
Até o período de execução da obra ou da atividade que está sendo monitorada tem sua importância. Além do fator climático, que é sazonal, a situação socioeconômica do país no período também tem sua influência: nível baixo de empregos tende a gerar um aumento da disponibilidade de mão-de-obra de qualidade no mercado, que tende a ser mais produtiva.
E não menos importantes são as características técnicas e operacionais da atividade. Executar a montagem de uma linha de tubulação de aço inox para transporte de oxigênio líquido em alta pressão, com espessura de 18mm e acoplamento soldado em uma área elevada de uma unidade de processo de uma refinaria tende a ser muito menos produtivo do que a montagem de uma linha de tubulação de aço carbono de mesmo diâmetro, mas com espessura de 6mm, sobre piso, em área aberta, para transporte de água em baixa pressão.
Mas as informações mais indispensáveis são os recursos e o tempo que compõem um índice de produtividade, pois são elas que irão definir o trabalho considerado.
Um índice de produtividade que contemple apenas horas produtivas de uma atividade, ou seja, as horas que agregam valor, terá um valor maior do que se contemplasse todas as horas da jornada de trabalho. O mesmo se aplica aos recursos. Um índice que contemple apenas o recurso drive de uma atividade terá um valor maior do que se contemplasse todos os recursos envolvidos na execução da atividade.
Portanto, note a quantidade de informações que deveriam vir atreladas aos índices de produtividade. Sem elas estaremos assumindo um risco elevado de usar dados que não são aplicáveis ao nosso projeto ou de aplica-los de forma incorreta, gerando cronogramas e orçamentos com baixa confiabilidade. E a realidade é que a maioria dos profissionais de construção utilizam índices históricos nessas condições.
E mesmo quando sabem disso o resultado ainda pode ser bastante negativo pois acabam tendo que adotar contingências de custo e prazo proporcionais ao nível de incerteza acerca dos índices utilizados, os comicamente conhecidos “fatores de cagaço”, podendo onerar demasiadamente um projeto e contribuir para reduzir sua atratividade junto aos patrocinadores ou, no caso de um processo de licitação de uma obra, reduzir a competitividade da proposta da empresa proponente (ou o inverso, podendo desonerar demais o projeto ou a proposta, tornando-os equivocadamente atrativos ou competitivos).
Atualmente existem bibliografias com registros históricos de produtividade, inclusive regionais, mas o foco ainda é restrito à construção civil de edificações comerciais e residenciais e a classificação das informações pelos fatores influenciadores da produtividade listados nesse artigo praticamente inexiste, o que pode dificultar sua aplicação no caso de necessidade de uma maior confiabilidade das estimativas. Pior fica para o mercado de construção pesada como o de infraestrutura e industrial, que carece de publicações do gênero, ficando as informações, quando geradas, confinadas no banco de conhecimento das empresas e de seus profissionais e muitas vezes com padronizações totalmente diferentes de uma empresa para outra, tornando a classificação e consolidação de dados a nível regional ou nacional algo praticamente impossível.
Portanto, visualizo duas oportunidades. Uma é a melhoria no processo de levantamento e classificação desses índices, tanto por profissionais quanto por empresas, com o intuito de aumentar a qualidade e a precisão das estimativas de prazo e custo de seus projetos. A outra, bem mais abrangente, seria padronizar e consolidar esses índices a nível nacional e torna-los acessíveis a todos, preservando, claro, a imagem das empresas. O objetivo com isso: obter um retrato real, amplo e confiável da produtividade do mercado de construção nacional, que serviria de balizador para diversos estudos e decisões, melhorar as estimativas de projetos em todo o país e instigar empresas menos produtivas a melhorar sua produtividade para se tornarem mais competitivas. Uma iniciativa que acredito que seria bem-vinda para um mercado tão marcado pela improdutividade.
Bruno Bachiega
Engenheiro Eletricista graduado pela UNESP, MBA em Gerenciamento de Projetos pela FGV e certificado PMP e PRINCE2, é especializado na gestão do planejamento e da execução de obras de construção e montagem industrial, tendo acumulado mais de 12 anos de experiência atuando em grandes empreendimentos em todo o Brasil nos segmentos de siderurgia, química, mineração e gases.
Artigo publicado em 13/05/2019 no blogdaliga.com.br