Tanto a literatura acadêmica como a experiência brasileira mostram que reformas econômicas são fundamentais para o crescimento da produtividade. A redução de distorções do ambiente de negócios contribui para o aumento da eficiência por meio de diversos canais, tanto no nível de cada empresa como no que diz respeito à alocação de recursos entre as firmas.

Dois exemplos ilustram a importância das reformas para o crescimento no Brasil. O primeiro foi o amplo conjunto de reformas institucionais do Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) implementadas entre 1964 e 1967. O desafio naquele período consistia, em primeiro lugar, em corrigir os desequilíbrios macroeconômicos herdados dos governos anteriores, como inflação em alta, déficits elevados nas contas externas e estagnação econômica. Além disso, era necessário modificar profundamente o modelo econômico de modo a criar as bases para a retomada do crescimento sustentado.

Além de medidas de estabilização macroeconômica, foram adotadas diversas políticas com o objetivo de modernizar o sistema tributário e a intermediação financeira, além de promover a inserção do país na economia mundial.

Na área tributária, foi criado um imposto sobre o valor adicionado na comercialização de bens (ICM, posteriormente transformado no ICMS), que substituiu um imposto de vendas incidente sobre o faturamento. No tocante ao sistema financeiro, foram introduzidos diversos instrumentos que viabilizaram a criação do mercado de capitais, assim como o financiamento do setor habitacional e do segmento de bens de consumo duráveis. A abertura econômica, por sua vez, foi estimulada pela simplificação do regime cambial, a eliminação de entraves às exportações e a remoção de restrições ao investimento estrangeiro no país.

Essas reformas tiveram papel fundamental no milagre econômico entre 1968 e 1973. De fato, tanto a produtividade do trabalho como a produtividade total dos fatores tiveram notável aceleração nesse período, contribuindo de forma decisiva para o crescimento do PIB a taxas superiores a 11% a.a.

De forma análoga ao PAEG, o Plano Real combinou medidas de estabilização com mudanças institucionais para modernizar a economia brasileira depois de décadas de forte intervenção estatal e substituição de importações.

As privatizações de empresas estatais, a criação de agências reguladoras e a reestruturação do sistema financeiro, com redução da participação de bancos públicos, foram componentes importantes dessa estratégia, dando continuidade à abertura da economia iniciada no final da década de 1980.

No início dos anos 2000, essa agenda teve o importante reforço das reformas microeconômicas voltadas para a melhoria das garantias no mercado de crédito, com a criação do crédito consignado, aprimoramento de mecanismos de alienação fiduciária e a aprovação da Lei de Falências.

Essas reformas tiveram um papel importante na aceleração do crescimento da produtividade. Como mostram os dados do Observatório da Produtividade da FGV IBRE, o crescimento da produtividade do trabalho acelerou de uma média de 0,2% ao ano (a.a.) no período 1995-2002 para 2,1% a.a. entre 2002 e 2007.

Desde 2016, o país entrou em novo ciclo de reformas. Assim como nos casos anteriores, as mudanças vieram em um contexto de sérios desequilíbrios macroeconômicos e perda de dinamismo da economia.

Na área de mercado de trabalho, houve um avanço importante com a aprovação da reforma trabalhista e da lei que estendeu a terceirização para atividades-fim. A criação da TLP contribuiu para a redução de distorções que decorriam do crédito subsidiado do BNDES e a implementação do cadastro positivo será importante para a diminuição do spread bancário.

Este ano foi a aprovada a reforma da previdência mais profunda já feita no país, e a tramitação da reforma tributária deve avançar em 2020 com a criação de uma Comissão Mista de deputados e senadores.

Este novo conjunto de reformas justifica certo otimismo em relação a uma aceleração do crescimento da produtividade. Nesse sentido, é surpreendente que a produtividade tenha caído nos três primeiros trimestres deste ano, como mostrou o indicador de produtividade trimestral do IBRE.

Uma possibilidade é que o efeito positivo das reformas sobre a produtividade ainda não tenha ocorrido, mas esteja a caminho. De fato, como ilustram os episódios do PAEG e Plano Real, pode levar alguns anos para que as reformas produzam seus efeitos.

Uma razão para isso é que reformas em geral são feitas em situações de crise econômica, quando a produtividade já se encontra em queda. Outro motivo é que, assim como no caso de inovações tecnológicas, a apropriação dos ganhos de produtividade propiciados por reformas econômicas exige uma reorganização na gestão das empresas, o que frequentemente é um processo demorado e sujeito a ajustes.

No entanto, é importante ressaltar que, embora reformas sejam condições necessárias para o aumento da produtividade, elas nem sempre são suficientes. Tanto no caso do PAEG como do Plano Real, as reformas tiveram seus efeitos potencializados pelo cenário externo favorável: entre 1968 e 1973 no período do milagre, e pelo boom da economia mundial nos anos 2000.

Outro fator fundamental para o efeito positivo das reformas anteriores foi a continuidade da política econômica. Tanto no período do milagre, como no primeiro governo Lula, os pilares da política econômica foram mantidos, o que reduziu consideravelmente o grau de incerteza e viabilizou o investimento de longo prazo.

No atual momento, entretanto, essas condições não estão asseguradas. De um lado, o crescimento mundial encontra-se em desaceleração. De outro, a polarização do quadro político nacional não ajuda a reduzir a incerteza. Talvez tenhamos que esperar mais tempo para que as reformas tenham o impacto almejado na produtividade.

Por Fernando Veloso – 30/12/2019.

Fonte: Blog do IBRE

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