Produtividade declinante trava economia brasileira
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Uma análise mais detalhada do desempenho da produtividade no longo prazo aponta esgotamento de fatores que explicam o crescimento econômico no Brasil mesmo antes da pandemia da covid-19. Segundo cálculos do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), a produtividade total dos fatores (PTF) recuou 0,6% ao ano, em média, entre 2014 e 2019, enquanto o valor adicionado à economia diminuiu 0,5% em igual comparação.
A trajetória parecida não é mera coincidência, uma vez que, em prazos maiores, o crescimento sustentado da economia depende de ganhos de eficiência no processo produtivo. A segunda metade da última década é o período de maior retração da PTF na série analisada pelo Ibre, ao lado dos anos 80. A PTF mostra a eficiência com que os fatores capital e trabalho se transformam em produção.
De 1981 – início da amostra – a 1990, a produtividade total da economia também caiu 0,6% ao ano. No ciclo mais produtivo da economia brasileira durante o intervalo analisado pela entidade, compreendido entre 2000 e 2010, o indicador avançou 1,5% na média anual, com alta de 3,5% do valor adicionado.
“Num ambiente de incerteza elevada, como ocorreu após a recessão de 2014 a 2016, e agravado no atual contexto da pandemia, os empresários postergam investimentos em capital físico e inovação, com impactos negativos sobre o crescimento do estoque de capital em uso e na PTF”, apontam os economistas do Ibre/FGV Fernando Veloso, Silvia Matos e Paulo Peruchetti, em estudo antecipado ao Valor.
O Ibre/FGV passará a publicar a evolução de indicadores anuais da produtividade total dos fatores no site do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, batizado em homenagem ao economista que morreu em 2017 e foi um dos maiores estudiosos do tema no país.
Segundo Veloso, Silvia e Peruchetti, a PTF permite uma melhor avaliação de como são usados os recursos produtivos em relação à produtividade do trabalho. Também amplamente utilizado, esse indicador leva em consideração somente a produtividade da mão de obra, observam eles, ao mensurar o valor gerado por trabalhador ou por ora trabalhada.
Nos últimos seis anos, os pesquisadores calculam que a produtividade por hora trabalhada ficou estagnada, com crescimento nulo na média anual, depois de ter avançado 0,4% de 2010 a 2014. A contribuição do estoque de capital em uso para o crescimento ficou ainda menor no período: esse componente da PTF subiu 1,2% ao ano, em média, nos cinco anos terminados em 2014, alta reduzida a apenas 0,1% daquele ano em diante.
Além da forte contração dos investimentos dentro do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro nos últimos anos, os pesquisadores do Ibre/FGV destacam que o perfil de recuperação do mercado de trabalho também pode ter sido uma influência negativa sobre a produtividade no período mais recente.
“A recuperação do emprego e das horas trabalhadas desde o fim da recessão em 2016 ocorreu por meio do aumento na participação de atividades informais e de baixa produtividade, o que pode ter contribuído para a queda da PTF nos últimos anos”, avaliam Veloso, Silvia e Peruchetti.
Diante desse cenário, na visão dos economistas, a única forma de gerar crescimento sustentado no Brasil nas próximas décadas seria por meio de reformas que levem a uma aceleração significativa do crescimento e da produtividade total dos fatores.
Coordenadora técnica do Boletim Macro do Ibre, Silvia afirma que é essencial melhorar o ambiente de negócios, com regras que beneficiem empresas produtivas e penalizem as menos eficientes. “Uma reforma tributária é essencial nesse sentido”, afirma Silvia, para quem é importante uma redução ao máximo de subsídios ou isenções tributárias, como o Simples, e ampla reestruturação dos impostos em todas as esferas do governo, para a criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
No curto prazo, porém, não se pode descartar possíveis impactos positivos da pandemia sobre a produtividade, ainda que em grande parte os efeitos sejam negativos, devido à disseminação das tecnologias de comunicação remota em meio à quarentena, pondera a economista.
O Ibre também elabora uma série trimestral da PTF, mas ainda não há atualização disponível para o segundo trimestre, que depende da divulgação dos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE.